proteger ou calejar?
Claro que o "sonho dourado" de toda
mãe era poder livrar seu filho do sofrimento e da dor, mas isso é
tecnicamente impossível no planeta em que estamos inseridos. Se a gente
resguardá-los de todos os incômodos físicos possíveis, ainda assim ele
terá que encarar as "dores da alma", as "dores psíquicas", que dóem
tanto ou mais que aqueles.
Claro que não defendo com isso a superexposição dos filhos a
qualquer tipo de intempérie, seja física, seja moral; mas acho que
devemos estar cientes de que, por melhor que façamos, faremos apenas a
nossa parte. Sempre existirão fatores que escaparão a nossa previdência,
o que não é necessariamente ruim. O nosso papel não é proteger, mas
preparar.
Creio que o preparo é a construção. O que vivemos no
dia-a-dia, o nosso esforço em fazer aquilo em que acreditamos, a nossa
coragem de nos superar por amor aos nossos filhos, a certeza de que
tomamos o maior número de atitudes possível baseadas em nosso esforço
máximo. Depois disso é confiar, é entregar à vida. Você não pode livrar
das doenças físicas, mas pode fazer todo o possível para que ele as
vivencie da melhor forma e resguardá-lo de qualquer tipo de
penúria nesse sentido; a gente não pode livrá-los das dores morais do
mundo, mas podemos prepará-los, com nosso amor, nosso exemplo e nossa
entrega, para que essas dores o elevem, sem destruir.
Nessa abordagem a família não seria aquela que protege, mas aquela
que prepara, não calejando, mas oferecendo recursos emocionais para que
a criança esteja equipada para, quando cair, pelo menos cair
de pé. Mais que isso, receio, está além de nossas condições nessa vida.
Quando eu não deixo meu filho chorar, quando eu estou disponível
tanto quanto posso, quando eu me preocupo para o advertir com respeito,
para não gritar nem jamais usar de violência, eu não o estou protegendo,
porque o mundo não é assim; eu estou lhe mostrando um modelo possível e
mais saldável de convivência, crescimento e interação, um modelo que,
espero, o possa iluminar e proteger, aonde quer que ele esteja; um modelo
que, caso eu um dia falte, fique gravado a fogo de amor e braza de
testemunho, para ele saber que ele merece ser tratado como uma pessoa
especial, não como pior que um bicho; um modelo que, espero, quando
ele amar alguém, ou quando ele for agraciado com a bênção inestimável da
paternidade, possa ressurgir e lhe fazer dar aos outros o mesmo amor e o
mesmo respeito que eu lhe ofereci. Mais que isso, não posso fazer.
Daí que, se eu não posso vacinar, posso lhe oferecer um legado de
amor e estrutura emocional transferível às gerações que vierem após
minha partida. De certa forma, então, isto é melhor que qualquer vacina
conhecida na Terra, porque expande seus benefícios para além do
inicialmente agraciado.
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